Crônicas

Mudança de papel

28/07/21 - 08:52

Foto: Denise Macedo
Foto: Denise Macedo

Por Élida Gontijo

Élida Gontijo

Lendo um livro do Carpinejar : Família é tudo. Comecei a pensar como a vida passa rápido, da infância pulamos para adolescência, a maturidade chega logo, logo. Parece que foi ontem que questionava a postura dos meus pais na minha criação, hoje tenho certeza que sou questionada por minhas filhas. Sinto muitas vezes repetindo hábitos dos meus pais, começo a rir quando percebo essa repetição. Não é fácil gerar, educar, constituir uma família dentro de um padrão que consideramos adequado. Vamos tropeçando aqui, ali, ensinando e aprendendo, muitas vezes os conflitos são grandes, gerações tão diferentes, há muitas interferências no relacionamento, a tecnologia mudou tudo, quem diria que iria mandar mensagens para as minhas filhas através de um celular? Quantas adaptações já fiz pra ter um lar em harmonia, respirando fundo, analisando se deveria ceder um pouco. Não foi fácil e nem é, vim da geração do “ engole o choro!” Engolir como? Minhas emoções sempre foram intensas, sorrio com a boca e meus olhos também escorrem sorrisos e dores. Como digerir todos os empoderamentos de hoje , que me desculpe a juventude, tem hora que esse poder extrapola.

Vivendo sempre no meio de jovens torna um pouco mais suave o entendimento, o saber conduzir os filhos, a convivência diária. Aprendi demais com meus alunos quando em minhas aulas mostravam as insatisfações com os pais, me enxergava em alguns exemplos, vendo que precisava assim como os pais deles me policiar um pouco. Mas na verdade não tem receita, tem sim erros e acertos, muitos e muitos. Tudo é aprendizado e formas de amor por nossos filhos, pela família que construímos Fico muito feliz por ver a liberdade que minhas filhas têm comigo, alegro ao ver que os valores que eu e meu marido passamos para elas estão sendo empregado, são pessoas que respeitam o outro, sabem mensurar a alegria e a dor do próximo. 

Meus pais me ensinaram todos esses valores de uma forma mais severa, foram muito cobrados , vieram de outra geração, sendo a submissão a palavra chave. Sempre teremos confronto de gerações, mas nunca será errado cobrar, colocar limites, posicionar, não podemos cobrar do outro aquilo que não aprendeu. Como cobrar dos meus pais menos preconceitos se vieram de uma geração que muitas coisas não podiam ser faladas? Recordo uma cena vivida com meu pai, em que falei que havia uma mulher lhe chamando na porta de casa. Tempo em que as casas a maioria não tinham campainhas, anunciávamos nossa chegada através das palmas ou gritando o nome do dono ou dona da casa. Meu pai queria dar uns tapas em mim e  deu a minha primeira aula sobre o uso dos pronomes de tratamento. Não poderia nunca falar que havia uma mulher chamando lá fora, deveria fazer uma análise se era uma senhora ou senhorita para empregar adequadamente os pronomes de tratamento. Mulher naquela época era um sentido conotativo, usado para designar mulheres de vida fácil, como diziam, prostitutas ,eu criança , achei aquela explicação bem esquisita , mas segui a risca, até hoje chamo tantas pessoas de senhora , ficou bem gravado. Coitado do meu pai deve sofrer vendo os jovens não empregando corretamente os pronomes de tratamento, quando falam você está de bom tamanho , o mais comum é ocê.

Os papeis vão mudando, a criança que fui ontem , hoje já é mãe e anseia por ser avó . Sigo minha caminhada administrando da melhor maneira a vida em família, penso que o melhor ingrediente é o amor. Muitas vezes misturado com a humildade de aceitar o erro, o pedido de desculpa. Sou uma eterna aprendiz, a vida é colcha de retalhos que requer costuras, emendas, trocas de retalhos, combinações das cores, mesmo que muitas não nos agradem. Continuo amando e agradecendo imensamente meus pais por terem me ensinado os valores que carrego hoje. Sigo com minhas filhas adultas, já invertendo os papéis, sendo mães quando preciso de colo. Muitas vezes rindo das minhas eternas manotas, da minha barulhada e falação, vamos nos fortalecendo nos laços fraternos pautados por um amor de um exemplo de casal, de família : Nossa Senhora e São José. Peço a todos meus leitores : sejam mais fraternos, mais família, mais toque, menos poder e mais amor. Que assim seja. 

Élida Gontijo - Julho de 2021. 

Élida Gontijo

Élida Gontijo