Morre Mônica Abreu, precursora de lei que obriga Estado a indenizar famílias de hansenianos

24/07/21 - 12:59

A professora Mônica Abreu, do Coletivo STC
A professora Mônica Abreu, do Coletivo STC

Celso Martinelli

Morreu no início da noite de ontem, sexta-feira (23), a professora sete-lagoana Mônica Fernandes Abreu, precursora do Coletivo Somos Todos Colônia de Hanseníase (STC). Ela veio a óbito após complicações de uma cirurgia de vesícula. O velório estava programado para às 13h, na Santa Clara (Praça José Antônio da Silveira – Canaan).

Nas décadas de 30 a 60, os filhos de pais portadores de hanseníase (também conhecida como lepra) eram separados de seus pais abruptamente pela polícia do Estado para viverem em colônias. Mônica liderou a luta para que fosse reconhecido que o Estado cometeu um crime contra essas famílias e indenizasse as mesmas.

Antônio Rodrigues, um dos membros e colaboradores do Coletivo STC, lamentou a morte da sete-lagoana. “Ela deixa um legado, a luta pelos direitos e indenizações justas para estes filhos que foram separados dos pais hansenianos tem que continuar”, afirmou. 

Veja abaixo, reportagem da jornalista Roberta Lanza:

Sete-lagoana é precursora de lei que obriga Estado a indenizar famílias de hansenianos

Roberta Lanza 

Tudo começou a partir da iniciativa da professora sete-lagoana Mônica Fernandes Abreu (formada em pedagogia pela FEMM e filosofia pela PUC. Mestre em filosofia pela FAE. Especialista em Política e Gestão de Saúde), do Coletivo Somos Todos Colônia de Hanseníase. “Nas décadas de 30 a 60, os filhos de pais portadores de hanseníase (também conhecida como lepra) eram separados de seus pais abruptamente pela polícia do Estado para viverem nessas colônias. Nesse período, a literatura indica que foram constatadas que cerca de oito mil crianças foram separadas de seus pais, o que nos fez entender que precisaríamos realmente lutar para reparar esse crime”, contou Mônica Abreu. 

Foi então que, no ano de 2018, o Coletivo Somos Todos Colônia de Hanseníase, encabeçado pela sete-lagoana, teve a iniciativa de planejar uma luta para que fosse reconhecido que o Estado cometeu um crime contra essas famílias. “Não foi fácil convencer os deputados a abraçarem o nosso sonho. Nesse período houve uma reunião na OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) do Rio de Janeiro com a representante da ONU (Organização das Nações Unidas), Alice Cruz, para apresentar a nossa proposta”, explicou. 

Com essa e outras ações, o Coletivo ganhou o respeito e apoio dos deputados da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) e a proposta foi abraçada pelo parlamentar Antônio Jorge (PPS), que entrou com o Projeto de Lei 4.828/17, que autoriza o Executivo a conceder indenização aos filhos de pessoas com a doença de pele. 

O Projeto foi aprovado e sancionado pelo então governador Fernando Pimentel (PT) no fim de 2018. “A partir daí, tivemos um novo desafio: que a Lei 23137/18 saísse do papel”, observou. Foi então que o Governo Federal propôs um acordo de R$14 mil aos prejudicados, que foi aceito pelos envolvidos.

Em março de 2021 as cinco primeiras famílias que aceitaram o acordo foram contempladas com o benefício. Minas Gerais foi o primeiro estado do Brasil a colocar a Lei em prática. “Nos sentimos orgulhosos de estamos à frente, como idealizadores do pedido de perdão de Minas. É com muita felicidade que eu comunico a todos os filhos do da hanseníase de Minas e do Brasil que o estado mineiro reconheceu na prática o crime comedido a essas pessoas. Não há valor de indenização para essas famílias que foram separadas, mas o Coletivo Somos Todos Colônia de Hanseníase entende que esses 14 mil é a primeira parcela da indenização e dará fôlego à nossa luta. É com muita alegria que dizemos que vencemos essa batalha”, finalizou Mônica Abreu.

Para os filhos de pais com hanseníase receberem a indenização, precisam simultaneamente atender algumas condições, entre elas: terem sido encaminhados a educandários, creches e preventórios ou terem permanecido nas colônias separados dos pais ou do convívio social; receberem até quatro salários mínimos e não terem acesso ao benefício concedido pela Lei Federal nº 11.520/07, relativa à pensão especial concedida a pessoas atingidas pela mesma doença.

O Movimento Somos Todos Colônia de Hanseníase informa que existem setelagoanos, curvelanos e de mais de 22 cidades que procuraram o grupo solicitando orientações. Mais informações no WhatsApp do Movimento: 55 (032) 9934 8921.

SOBRE A HANSENÍASE
Conhecida no passado como lepra, a hanseníase é uma doença infecciosa causada por uma bactéria chamada Mycobacterium leprae ou bacilo de Hansen. A transmissão se dá por meio de convivência muito próxima e prolongada com o doente da forma transmissora, por contato com gotículas de saliva ou secreções do nariz. Tocar a pele do paciente não transmite a hanseníase. Em todo o mundo, o tratamento é gratuito. Em 2016, o Ministério da Saúde registrou no Brasil mais de 28.000 novos casos da doença, que tem cura, mas, se não tratada, pode deixar sequelas.

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