Efe Godoy e o direito adquirido de renascer “mulher”

Junho é o Mês do Orgulho, quando as comunidades LGBTQAI+ do mundo todo se reúnem e celebram a liberdade de serem elas mesmas

01/07/22 - 12:15

Efe Godoy comemora a nova certidão de nascimento
Efe Godoy comemora a nova certidão de nascimento

Roberta Lanza

Quem não se lembra da sigla GLS, que ganhou força na década de 90? O significado era pessoas gays, lésbicas e simpatizantes. Com o passar dos anos, a sigla evoluiu com a inclusão de pessoas de diversas orientações sexuais e identidades de gênero, sendo a LGBTQIA+ a mais atual para representar o movimento político e social que defende a diversidade e busca mais representatividade e direitos para essa população.

Cada letra representa um grupo de pessoas:
L = Lésbicas - São mulheres que sentem atração afetiva/sexual pelo mesmo gênero.
G = Gays - São homens que sentem atração afetiva/sexual pelo mesmo gênero.
B = Bissexuais - Diz respeito aos homens e mulheres que sentem atração afetivo/sexual pelos gêneros masculino e feminino.
T = Transgênero - Também chamadas de “pessoas trans”, elas podem ser transgênero (homem ou mulher), travesti (identidade feminina) ou pessoa não-binária, que se compreende além da divisão “homem e mulher”.
Q = Queer - Pessoas com o gênero ‘Queer’ são aquelas que transitam entre as noções de gênero, como é o caso das drag queens. 
I = Intersexo - A pessoa intersexo está entre o feminino e o masculino. As suas combinações biológicas e desenvolvimento corporal – cromossomos, genitais, hormônios, etc – não se enquadram na norma binária (masculino ou feminino).
A = Assexual - Assexuais não sentem atração sexual por outras pessoas, independente do gênero. 
+  - O símbolo de “ mais ” no final da sigla aparece para incluir outras identidades de gênero e orientações sexuais que não se encaixam no padrão cis-heteronormativo. 

Junho é o Mês do Orgulho, quando as comunidades LGBTQAI+ do mundo todo se reúnem e celebram a liberdade de serem elas mesmas. As manifestações do orgulho estão enraizadas na árdua história de grupos minoritários que lutaram por décadas para superar o preconceito e serem aceitos por quem são na comunidade. 
Sete Lagoas já mostra sinais de evolução, nesse sentido. A artista plástica trans Efe Godoy comemora a recente conquista de nova identidade, sendo reconhecida legitimamente como pessoa do sexo feminino, desde o dia 27 de maio de 2022. 
 

Em suas redes sociais, Efe comemorou.
“ME CHAME PELO MEU NOME! Este dia se torna meu novo nascimento! Tchau nome morto! Sim! Agora é oficial para o estado e para todo o país e planeta, aqui quem fala é a EFE GODOY! Não foi um caminho fácil essa retificação de nome e gênero, e não sou das pessoas mais pacientes do mundo, porém saiu! Tá aí! A partir de agora não tem desculpa, inclusive aos parentes e amigues, peço que se esforcem para me chamar pelo meu nome! Beijos de luz da pessoa mais feliz da terra hoje!”

Em matéria especial sobre o Mês de Orgulho LGBTQIA+, Efe conta sobre sua caminhada e transição:

“Meu nome atual é Efe Nogueira Godoy. Sou filha de Mauro José de Godoy e Silva e Regina Celis da Silva Nogueira de Godoy, irmão de Daniela Nogueira Godoy.  
É muito recente a mudança e alguns familiares ainda me chamam pelo "nome morto" que meus pais escolheram. Tô com 33 anos, nasci em Sete Lagoas no dia 07/12/1988.
Minha infância foi livre, sinto que tive toda liberdade de expressão, porém dentro da normatividade cisgenera, ou seja, dentro dos limites do gênero de nascimento, apesar de eu brincar sempre com minha irmã com confecção de roupinhas para as Barbies dela. A gente passava horas fazendo isso. 
Estudei a vida toda em escola pública. Mamãe sempre foi professora e trabalhou no Arthur Bernardes, e lá estudei até a quarta série. Depois fui para o Estadual, onde me formei no ensino médio. 
Adorava dar voltas na Lagoa Paulino, subir a Serra Santa Helena a pé, gastar energia de aventura. Sempre fui incentivada a ser artista, ganhava materiais de arte e tinha tardes de criatividade onde explorava cada material ao meu alcance. 
A Absinto Muito foi minha banda com Dedé Santaklaus, Renato Ribeiro, Henrique Ribeiro, Janclô (Vitor Gabriel) e Diogo Opala. Viajamos para fora e fizemos muitos shows, mas comecei a me apaixonar pela performance arte na Escola Guignard quando me mudei para Belo Horizonte, onde até hoje atuo no campo das artes.
Meu processo de mudança de gênero começou depois de um término de relacionamento hétero que durou cinco anos. Eu já sentia que era bissexual e isso mexia com meus desejos e vontades. Fui para uma experiência de Festival de Performance na cidade do México e lá encontrei várias pessoas parecidas comigo, o que eu achava que não existia. Me senti acolhida, e não mais um ‘extra-terrestre’. Voltei mexida, afetada, e comecei a me entender pessoa não binária, ou seja, não me identificava nem com o gênero masculino (de nascença), nem com o gênero feminino em si. 
Com o tempo fui entendendo minha performatividade feminina e me entregando mais a esse universo. Hoje vejo meu corpo como um corpo trans, e sempre foi, porém dentro de um casulo. Tudo aconteceu, e ainda acontece, muito gradativamente, nada foi de uma vez. 
Mamãe sempre soube, nunca me questionou; papai está entendendo aos poucos, precisa de um tempo maior para se atualizar; e o restante da família vai assimilando as mudanças cada um no seu tempo, tem que ter paciência. 

A disforia acontece em muitos casos de transição, mas ainda estou no processo, me assumir travesti foi difícil, mas consegui. Depois que quebrei essa barreira tudo começou a tomar forma. Estou no comecinho do processo hormonal, ou seja, muita coisa ainda vai mudar. É uma metamorfose, mas pelo menos do casulo eu já saí.

Eu percebi que deveria mudar minha identidade perante a justiça brasileira quando o meu nome social começou a ser desrespeitado. Fazer a mudança no cartório é um processo lento e caro. Muita burocracia quando você faz esse processo sozinha, e foi o que fiz: corri atrás de muitos documentos que comprovavam minha existência e depois disso entrei com o processo de mudança de gênero e pré nome. 
Hoje tenho sexo feminino e sou a Efe, uma existência feminina. Contei para a mamãe que mudaria e ela disse que o que me fizesse feliz a faria também feliz. Isso foi lindo para mim. Inclusive quero até fazer um ritual com ela de enterrar minha antiga certidão de nascimento comigo, pois é um novo nascimento.

O Brasil é o país que mais mata pessoas trans e travestis, e se assumir num país desses dá medo, eu sinto medo todos os dias de ser atacada, mas resisto. Na prática não muda muito a legalização do nome que escolhi, mas pelo menos tenho como provar que meu nome é esse. 
A transfobia é muito latente ainda, mas sinto que as coisas estão mudando, como por exemplo tivemos a Lina (Lin da Quebrada) no BBB22, que trouxe o assunto do pronome à tona, ela/dela. Meu pronome é um direito e deve ser respeitado! A mensagem que eu trago para corpes dissidentes é: NÃO DESISTAM!”.

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Efe com os pais: Mauro José e Regina Celis

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Efe Godoy antes da transição

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Nova Certidão de Nascimento


 

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