Qual foi a mudança mais difícil que enfrentou na sua vida?

Recebi essa pergunta ontem, exatamente como está escrita. O interlocutor esperava uma resposta pronta e objetiva, que lhe servisse de incentivo por estar passando por momentos de turbulências pessoais. 
Ele queria uma forma rápida para orienta-lo de como proceder diante as questões familiares, o que fazer pelos problemas que atravessa nos negócios ou como ser eficiente na situação afetiva. Ele buscou em mim, mas na verdade, acabou me entregando. 
Não fazia ideia do quão provocativa foi a sua pergunta.
De estalo, realmente me veio à cabeça uma gama infindável de assuntos. Me fez lembrar os caminhos tortuosos que passei, na busca de uma bela história para que eu pudesse lhe entregar o esperado final feliz de um acontecimento épico.
Mas foi diferente. Me veio as dores e sofrimentos do percurso. Momentos de angustia, tristezas e derrotas. Se há superações, inevitavelmente haverá tempos ruins anteriormente.
Minha transição da infância para a adolescência?! Era gordinha, branquela, de cabelos escorridos, que mais lembrava um leitãozinho de véspera de natal. Meus avós amavam minha bochecha e era muito bom enquanto eu era uma criança.
Mas não foi na juventude. Bulling, o último da turma a ter uma namoradinha e o que nunca era chamado para as festinhas e nem escolhido no futebol. Enveredei na natação, futebol, corrida, capoeira, karatê e todos os esportes que tive acesso. Venci com louvor essa etapa. Não foi essa a mudança mais difícil.
Os desamores e deslealdades afetivas?! Como dói sofrer por amor. Ou pelo amenos por aquilo que pensa ser. A rejeição, o desprezo, a impotência de não poder fazer nada com o que pensa ser o maior sentimento do mundo. É uma dor que vai nos ossos e também passei por ela. Mudei de pessoas, sentimentos e pensamentos. Também não foi a mais difícil.
A perdas?! É difícil aceitar a perda de coisas como nas finanças, conforto, vestibulares não aprovados, moradias e empregos.
Pior a de pessoas. Me veio à cabeça Dudu e meu pai. O primeiro era o meu inseparável amigo, que morreu em um acidente de trânsito aos 21 anos. Conversamos na sexta-feira e ele se foi para sempre no sábado. Antes não havia perdido ninguém e nem imaginava o quão devastador era isso.

Meu pai era meu mentor, minha referência, meu maior amor, que sem aviso prévio, também em um sábado, se deitou como em todas as noites anteriores para repousar na eternidade. 
Nos dois casos, não tive oportunidade de me despedir, preparar a sequência e me organizar. Foram os dois de repente, e certamente teve que ser tudo diferente. Mudanças extremamente difíceis. Mas ainda não foi a pior.
ACEITAÇÃO!

Essa foi a minha mudança mais difícil. Aceitar e receber as coisas de bom grado. Todas as passagens que trouxe são exemplos de que eu, apesar de me julgar imbatível, nem de longe poderia controlar todas as coisas.
Antes acostumado com tudo do meu jeito e tempo, fui obrigado a aprender a receber com gratidão e aceitar, mesmo quão dolorosas elas pudessem ser. Mesmo que aparentemente ruim, sempre trazem algo positivo, que contribui para a nossa melhora enquanto ser.
A obesidade me ensinou a ser determinado e superar meus limites físicos e mentais, em situações de extrema pressão. Os fracassos amorosos me trouxeram amor próprio, fiquei mais sensível e empático para os que viriam em seguida. A partida do meu amigo e pai mostrou que acima deles existe um Deus maior, que continua a cuidar de quem Dele se aproxima. 
Aprendi que um dia o pai dá lugar ao filho para que ele também exerça o seu papel de provedor e que os jovens, assim como o meu amigo, não são imortais.
Ou eu permaneceria em sofrimento por todas essas circunstancias terem saído do meu controle, ou viveria em paz, simplesmente por aceita-las.
Aceitação, em tudo que está fora do meu controle. Essa foi a minha mudança mais difícil