Mortes por covid poderiam ter sido evitadas?

19/06/21 - 10:38

A jornalista Márcia Raposo
A jornalista Márcia Raposo

Márcia Raposo
Jornalista

O primeiro caso de contaminação pelo coronavírus no Brasil aconteceu em fevereiro de 2020. Na ocasião, o mundo sabia muito pouco ou quase nada sobre aquele vírus mortal que se espalhara pelos países afora. Hoje, já com o avanço de pesquisas e a descoberta de vacinas, alguns começam a voltar ao “normal”. Mas no Brasil o número de mortes avança dia a dia. São quase meio milhão de pessoas entre idosos, adultos, jovens e crianças que partiram. Você já se perguntou se o fim dessas vidas poderia ter sido evitado?

Eu me pergunto todos os dias. Me angustio e me revolto. Quem perdeu alguém que ama, conhece essa dor. Não só pela partida, mas pelo modo como ela ocorreu. Sem o último beijo. O último abraço. Sem poder dizer “eu te amo” e ser ouvido. Sem segurar as mãos. Sem visitas e sem velório. Caixões fechados e enterros rápidos. Tudo isso tem a marca da desumanidade. 

Sim, o vírus que provoca a doença covid é arrasador das emoções. Mas existe uma desumanidade maior e que poderia não existir. Trata-se da presença do Estado / governo no enfrentamento do que se tornou uma pandemia mundial. A linha da história deste vírus no nosso país mostra ausência do governo. 

Não houve, e ainda não há, uma coordenação nacional efetiva sobre ações de controle da transmissão. Nunca houve uma campanha massiva de informação para a população. Ao contrário, temos um presidente que, diariamente, atua para desinformar e confundir, uma vez que, desde o início, nega a existência da doença e a sua gravidade.

Não sou eu que digo isso. São manifestações internacionais, são cientistas, especialistas, governadores, prefeitos, equipes médicas pelo Brasil afora de unidades de saúde sem equipamentos de proteção, sem insumos, sem oxigênio. E é a CPI instalada no Senado para apurar possíveis falhas e omissões do governo federal no combate à pandemia. 

Ela já fez um levantamento de quantas vezes, com identificação de datas e locais, o presidente Bolsonaro negou a pandemia. Em um ano, foram 200! A troca de ministros da Saúde – quatro vezes desde o ano passado – também mostra como age o presidente. Se o ministro não segue a postura negacionista dele, cai. 

Leio notícias, entrevistas, artigos, assisto vídeos, acompanho dia a dia o caminhar acelerado da pandemia. Criaram-se, infelizmente, pela polarização adotada também pelo presidente, duas vertentes: a que aponta como solução a permanente adoção de medidas de controle, como distanciamento, uso de máscaras pff2, higienização das mãos e vacinação; e outra, que admite a vacinação, mas sem obrigatoriedade, e insiste na prescrição de medicamentos com eficácia não comprovada cientificamente. 

O tal “kit covid”, ou tratamento precoce, é defendido pelo presidente. Segundo a CPI, orientado por um “gabinete paralelo”. É assim, então, que ele tem levado apoiadores a se aglomerarem, todas sem máscara, inclusive ele.

Eu poderia aqui relacionar as descobertas da CPI até agora sobre o comportamento do presidente e de parte de seu governo que, em minha opinião, reflete o descaso na abordagem da grave crise sanitária que o país vive. Da ausência de empatia com aqueles que perderam pessoas queridas pela covid. 

Mas vou destacar apenas uma: dia a dia chegam documentos oficiais do próprio governo revelando a demora na compra de vacinas, usadas no mundo inteiro como “remédio” para reduzir o número de contaminação e evitar internações e mortes. Mesmo tendo vacinas, a distribuição delas se dá lentamente. 

Uma das análises feitas sobre este cenário de negatividade adotado pelo governo é o de que a sua aposta é de atingir a imunidade de rebanho através da contaminação. Ou seja, quanto maior o índice de pessoas contaminadas, maior a chance de controle da  doença. É chance, não certeza. E não importa quantas pessoas morram nesse trajeto insano. 

Até agora, estamos chegando a meio milhão. Adoecer um país inteiro a este nível é possível? É correto? É isto que cidadãs e cidadãos esperam de seu governante?

Por outro lado, a  ciência aponta a vacina como o meio eficaz para se atingir a imunidade quando se trata de doenças virais. Não só da covid. A ciência que aponta a vacinação como estratégia vem sendo ignorada e desqualificada, conforme atestam as evidências. 

E se esta não tivesse sido a escolha do governo, muitas mortes teriam sim sido evitadas.

Veja Mais