-O que faço aqui? Porque mandou chamar-me? Quem é o senhor? O senhor por acaso é um delegado? Por que pediu que eu viesse? Não me lembro de ter cometido nenhum delito! Espera um pouco, o senhor não vai dizer que só porque verti água do joelho atrás do poste cometi crime hediondo, vai? Sou um homem com problemas de continência. Quando a vontade aperta, não dá pra segurar. O senhor nem imagina como dói e acredito que não a querer que na minha idade eu fosse passar o vexame de me molhar todo na rua, ia? Como podem as leis dos homens serem superiores às leis fisiológicas, meu Deus! E tem mais seu delegado, na hora que verti água, não havia vivalma na rua e tive ainda o cuidado de esconder-me atrás de um poste para maior segurança. Essa não! Outro delito não cometi!
O senhor não é delegado? Então é o que? Ah! Já sei. Careca como é deve ser diretor de colégio. Pelo amor de Deus não venha me dizer que meu filho já aprontou de novo? Da última vez, apliquei-lhe uma bela e longa carraspana e ele prometeu-me não mais delinquir! O que foi desta vez? O senhor sabe, a gente tenta fazer a parte da gente, mas adolescente não é gente desse mundo. Está bem pode dizer o que aconteceu. Seja lá o que for eu aguento. Mas ele me paga desta vez! Ah, se paga! De agora em diante ele vai andar miudinho comido. “Comida no canudo e couro à miúdo”. Atraso na prestação não é, porque trago meus compromissos religiosamente em dia. Posso mostrar-lhe se quiser todos os contracheques. É só dar um tempo que eu busco em casa. Se não for coisa do meu filho, outra não é.
Também não é diretor de colégio? Então deve ser gerente de banco. Mandou chamar-me para abrir uma conta, uma poupança, oferecer um cheque especial, captação, pecúlio, fazer algum tipo de investimento, aposentadoria programada, seguro, títulos de capitalização, etc., etc. É, porque Saldo devedor não é coisa do meu feitio. Nunca dei um borrachudo na minha vida. Cheque procissão Nem pensar! Pelo que me consta não sou avalista e ninguém, então só pode ser oferta de produtos bancários, certo?
O senhor também não é gerente de banco? Uai! Ah, matei a questão. O senhor é político, certo? Como que eu não desconfiei antes! Bom, eu vou logo dizendo que não entendo muito desse negócio. Nunca fui filiado a nenhum partido e sempre votei achando que votava respeitando as minhas convicções e sempre no melhor. E o senhor não vai me levar a mal não, mas os políticos andam muito desacreditados ultimamente, o senhor não concorda? É certo que existem alguns que são direitos e pensam nos problemas da cidade e no bem estar da população, mas a maioria? Sei não viu? Bem, no momento não tenho nenhum candidato, partido não importa pra mim, mas ainda que mal pergunte o senhor é candidato a quê?
Não é político também? Afinal de contas quem é o senhor e o que faz?
-Sou porteiro. Meu nome é Pedro. Não fui eu quem mandou chamá-lo, foi Ele