Coluna Católica – OLHA NOS MEUS OLHOS, SENHOR!

por Padre Evandro

Na antiga tradição judaica havia um princípio muito interessante: ninguém podia ver a face de Deus, senão depois de sua morte. Isso corresponde ao ensinamento que afirma “não vereis a minha face” de Êxodo 33-20 quando Deus diz a Moises que ninguém pode ver a Sua face e continuar vivo. Assim, muita são as cenas bíblicas em que se há um pedido de afastamento diante da face de Deus, pois ninguém pode o ver em vida. Por isso, quando Pedro é chamado por Jesus na pesca milagrosa, diz: “afaste-se de mim, porque ou um pecador (Lc 5-8).

Fico pensando que a força deste reconhecimento da presença de Deus em Jesus é que leva Pedro a temer o olhar acolhedor e transformador do Mestre. Pedro não havia entendido que a presença de Deus, seu olhar sobre nós é completamente mudado do Antigo para o Novo Testamento. Isso mesmo: o Deus dos tempos antigos, agora revelado em Jesus, é uma Pai desejoso de proximidade, cuidado, presença e companhia. Não desvia de nós o Seu olhar e não nos pede para nos escondermos temerosos diante Dele.

Tantas vezes ainda tenho encontrado situações onde o medo é maior que as manifestações de confiança no amor. Parecemos muito mais crianças medrosas e assustadas por fantasias assustadoras, e não adultos na fé que testemunham a esperança na Graça que nos conduz. E pior, costumamos reproduzir e ensinar novas gerações este equivocado olhar, sem notar o mal que estamos fazendo para a realização da obra misericordiosa de Deus na vida e história das novas gerações.

É admirável a humildade de Pedro que ao reconhecer-se pecador se lança aos pés de Jesus. Mais bonito ainda, é entender que ele está, neste gesto, clamando por misericórdia. Isso é acolhido por Jesus. Ou seja, Deus acolhe nossa condição e provoca um convite à conversão. “Farei de vós pescadores de homens”. Essa metáfora renova a certeza de que Jesus usa o que temos e somos para realizar a transformação que necessitamos. Não despreza nada. Antes, acolhe, ama e trabalha com o que temos.

Não precisamos temer ser o que somos diante da face de Deus. Encontrar-se como Ele, e estar face a face com o Senhor é movimento de Graça revolucionária que desinstala a pequenez que trazemos, fazendo-nos ser o que somos em plenitude. Por isso, ouso dizer: Olha nos meus olhos, Senhor!