por Amauri Artimos da Mata
“Lavras do Campo das Vertentes, da Serra dos Ipês. Foi assim que Deus te fez. Foi assim que Deus te fez. Sua voz Altiva na história sempre ecoou. No campo e na escola, a seus filhos ensinou. O ouro que corre nas veias, do povo das Minas Gerais. É a cultura espalhada na terra, na voz das meninas de Lavras. Do canto coral, das belas canções. Em Sete Lagoas, vieram pousar e ficar em nossos corações! Do canto coral, das belas canções. Em Sete Lagoas vieram pousar e ficar em nossos corações!” (Em Sete Lagoas. Amauri da Matta, março de 2024). Essa poesia, que se fez canção, foi escrita a pedido do maestro José Maciel, do Coral das Meninas de Lavras, que realizou uma turnê na região sudeste e veio visitar o Coral Dom Silvério, aqui também se apresentando (10-05-2024, 19h). Tal não foi a minha surpresa quando, no apagar das luzes de 2024, José Maciel fez-me contato e convidou-me para ir à sua cidade, no evento de comemoração do aniversário do Coral das Meninas de Lavras, para vê-las cantar a música que eu compus e receber uma homenagem da instituição.
Eu, naturalmente, fiquei muito feliz com o convite. Mas o leitor deve estar se perguntando: o que isso, afinal, tem a ver com a nossa cidade e a Capital de Minas Gerais? Explico. Lavras tem um filho ilustre que foi Presidente da Província de Minas Gerais (1902-1906), na época em que o termo “Presidente” equivalia a Governador e “Província”, a Estado. É que Francisco Sales, então Presidente da Província de Minas, tal como as meninas cantoras de sua cidade natal, veio visitar Sete Lagoas, aqui ficando por quarenta dias, de janeiro a fevereiro de 1905, em período de descanso. Mas não deixou de trabalhar, o que representou, na época, a transferência temporária da Capital de Minas Gerais para a terra dos lagos encantados. Um dos nossos maiores benfeitores – Dr. João Avellar – abordou esse fato histórico, em poesia, na sua coluna do Jornal “O Reflexo”, com a seguinte trova: “A Sete Lagoas. A ti saúdo, contente, ó minha terra natal, porque tu tens, atualmente, as honras da capital” (15-01-1905).
A vinda de Francisco Sales foi muito festejada na cidade, e noticiada, ainda, no referido jornal, da seguinte forma, como lembra LÚCIA VICTORIA DE AVELLAR: “Em dois extratos de seu noticiário, O Reflexo de 8 e de 15 de janeiro de 1905, assim registrou: (…) Em uma vitória – ‘carruagem para dois passageiros, com quatro rodas, cobertura dobrável e boleia’; nome dado em homenagem à rainha Victoria, monarca inglesa, segundo esclarece a nota de rodapé do livro – mandada vir de Belo Horizonte pela municipalidade, seguiram da Estação para a casa destinada ao Dr. Sales, sua Exma. Senhora, com uma filhinha, e a Senhora do Dr. Ottoni. Havia outro carro, mas Sua Excelência teve a gentileza de preferir seguir a pé até a casa, com as comissões que o foram receber (…) Ao regressar de Belo Horizonte, Sua Excelência e seu companheiro de viagem seguiram, a cavalo, da Estação para a casa de sua residência, acompanhados de grande número de cavalheiros (…)- (O Reflexo, 1905)”.
Relata a saudosa escritora, igualmente, que o casarão onde Francisco Sales e sua família ficaram hospedados, conhecido como “Palácio Presidencial”, foi gentilmente cedido pelo Dr. Manoel Chassim Drummond e sua esposa, Dona Oscarlina, ou ‘Siá Calina’. Nesse sobrado, “o presidente mineiro chegou a despachar papéis oficiais e a dar audiência na casa que, ainda hoje, pode ser vista com a mesma fachada, no nº 240.” Sua propriedade, em 1984, era de Celita Rocha Drummond Carvalho, que, com “apurado gosto e cuidado”, manteve “a casa bem conservada, dando realce às suas características coloniais” (Dr. Avellar na Sete Lagoas Antiga, p. 36. Belo Horizonte: Mosaico Produção Editorial, 2019. 254 páginas).
É com grande satisfação, assim, que relembro a vinda do Coral das Meninas de Lavras à nossa cidade, em maio do ano passado, para aqui nos presentear com uma linda apresentação, mais de cem anos após o filho ilustre daquela cidade ter honrado Sete Lagoas com estada tão importante! Fato histórico que deve ser lembrado por cada sete-lagoano, ao passar na Praça Francisco Sales, localizada no centro da cidade (próxima ao Banco do Brasil), e cujo nome homenageia notável personalidade.