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Flávio de Castro: Fazendo graça com o seu direito
Por tradição, os vereadores têm aprovado leis urbanísticas com claro desconhecimento da matéria. Aparentemente, movem-se apenas por conveniência política. No que interessa, não oferecem à cidade um arcabouço jurídico seguro, efetivamente capaz de promover o nosso ordenamento territorial. Já passou mesmo da hora da Câmara dispor de uma assessoria técnica na área urbano-ambiental, como tem na área jurídica, apta a orientar e alertar os nobres edis. Essa superficialidade na apreciação de temas relativos à política urbana é um grande complicador quando se tem na pauta, como é o caso, um projeto de lei absurdo como o que dispõe, mais uma vez, sobre a regularização de construções clandestinas ou irregulares.
Leis assim são necessárias, especialmente para construções de interesse social, mas são sempre muito delicadas. Elas devem corrigir irregularidades, jamais incentivá-las. Entretanto, a linha entre uma coisa e outra é tênue. Quando se incorre no erro de se incentivar irregularidades, o problema não se atém a um ou outro beneficiado, mas a uma desvalorização geral da legislação. Se mais hora, menos hora, eu regularizo, por que vou respeitar a lei?
O atual projeto tem pontos assustadores. Usualmente, o foco de regularização são construções executadas em que a fiscalização falhou por não as ter embargado tempestivamente. O primeiro ponto que assusta é exatamente esse: a proposta agora é regularizar construções apenas iniciadas, com alicerce executado e uma ou outra fiada de tijolos. Ora, nesses casos iniciais, a obrigação é fiscalizar, embargar e, quando for o caso, exigir a demolição. Não mais! Vai-se regularizar o que ainda sequer existe!
A coisa não para por aí. A Prefeitura quer invadir também o direito de vizinhança. Se você tem um lote, o seu vizinho, por lei, não pode construir na divisa acima da altura de 6,5 metros. Isso resguarda a qualidade ambiental de seu imóvel. Mas se o seu vizinho for irregular, pelo projeto de lei, ele pode chegar a quase 8 metros. Quase um prédio de 3 andares colado na sua casa. A Prefeitura está fazendo graça com o seu direito. O que lhe resta? Resta orar para o seu vizinho ser um cara correto. Não espere correção da Prefeitura e da Câmara!
Flávio de Castro
fjrcastro@gmail.com