Artigo – Homenagem a Paulinho Libório (22/04/1944 a 19/06/2020)

15/07/20 - 15:42

Paulo Libório estava com 76 quando faleceu
Paulo Libório estava com 76 quando faleceu

Paulo Roberto Libório França, o Paulinho Libório (foto), dos Franças das terras de Inhaúma, da fazenda Guará, é neto da grande família de Herculino Paula França e Marieta Teixeira França e seus 13 filhos, José Alberto, Otávio, Adalberto, Alcides (pai de Paulinho), Abel, Fábio, Hernane, Augusta, Lídia, Geralda, Alda, Leomoldina e Marta. São citados como pessoas de grande humanidade, simpatia e educação, sentimentos que parecem remeter a outra época. Alcides teve grande projeção na sociedade lacustre, além de fazendeiro foi sócio e gerente do Banco Agrícola, da Caixa Econômica Estadual e diretor presidente da Cooperativa de 1958 a 1963 – e faz parte dos bem-sucedidos personagens que ocupam a margem da lagoa Paulino, símbolo de sucesso e poder a cada fase da história econômica da cidade.

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Imóveis de Alcides, pai de Paulinho Libório, na orla da lagoa Paulino
 

 

O Banco Agrícola e a Cooperativa tinham grande interface no incentivo aos produtores rurais para suprir o mercado regional, ambos eram a princípio cooperativas, e foram permutando o potencial do contingente operário da Central do Brasil para outras oportunidades e novas frentes. O beneficiamento do gado, principalmente, marcou época em Sete Lagoas tornando-se a maior bacia leiteira do estado (hoje a cidade é a 226ª). Alcides Teixeira França aparece como fundador da Cooperativa dos Produtores de Leite, em 1946, as informações da Cooperativa o citam como diretor presidente de 1958 a 1963. Paulinho entra como cooperado em 1964, aos 20 anos. O patriarca Herculino tinha fábrica de farinha e venda de arroz em Inhaúma, a fazenda colada na entrada de Inhaúma, à esquerda.

 

De Alcides era a grande e produtiva fazenda Guará, no caminho de Inhaúma. Eles mudam para Sete Lagoas no final dos anos 1940, moraram no Vitória Hotel enquanto a casa era construída, convivendo na área central e nas terras inhaumenses simultaneamente,  onde é parte hoje o restaurante do Nathan. Paulinho contava sempre memórias das ruas principais da velha Sete Lagoas. A Lagoa Paulino era apenas de moradias e diante do fenômeno ainda bem natural. As ruas do comércio eram movimentadas, pitorescas, e cumpriam o ritual de se transformarem, à noite, em espaços de lazer. Sô Newtão Fernandino, companheiro do pai Alcides no banco Agrícola, atravessava de barco a lagoa para ir trabalhar e às vezes trazia o diretor e médico Bernardo Alves Costa para consultar seus filhos. A mãe de Paulino, Maria Helena Libório, era filha do João Libório Jr, figura lendária que tocava na banda União dos Artistas e a fazia de charanga e os bailes carnavalescos do Ideal Esporte Clube, clube que ele fundou em 1918. João Libório Jr aparecia também em outras bandas e era um dos músicos que fazia a animação musical dos cinemas da cidade. Consta nos libelos do Ideal que ele tinha uma rinha na sua casa, na rua Dr Pena e faleceu em 1919, aos 29 anos, de apendicite aguda. São histórias que somam a essa casa agora vazia.

 

Paulinho forma em medicina veterinária na UFMG nos meados dos anos 1960 e passa uma temporada em Curvelo, no atual IMA, Instituto Mineiro de Agropecuária. Com a morte do pai, volta a Sete Lagoas para cuidar da grande e boa Guará. Comprou e vendeu outras fazendas, como a Onça, antes do Pacu, outra em Paracatu. Entrou junto com Afrânio Avelar na Cooperativa, sendo seu diretor financeiro, de 1977 a 1983, ocupando o mesmo cargo entre 1992 a 1995, com o mesmo Afrânio e outros companheiros, como João Luiz de Freitas Reis e Dilson José Dutra, o China. Sua correção e ética eram ressaltadas. A Cooperativa de Sete Lagoas e o Sindicato Rural são dos lugares mais sociáveis da história local, e suas histórias merecem ser buscadas. Ouvia os casos de Paulo sobre as festas da região onde se matasse só um, não era considerada boa.
 

Histórias tão robustas que envolviam um conjunto expressivo de cidadãos lacustres, não é novidade que se perderam, nas mutações que acompanham a economia de Sete Lagoas, descapitalizada e açambarcada pelo avanço do capital metropolitano. O Banco Agrícola, exclusivo praticamente de setelagoanos, tornou-se um banco estadual e nacional, e foi engolido. A Cooperativa viu seu patrimônio sendo vendido, como é o caso do prédio da rua Zoroastro Passos e o terreno na esquina de João Andrade e Cel Américo, onde ficava sua patrulha mecânica, entre outros exemplos. Hoje não recebe mais o leite, a Itambé quem faz o repasse. Os contratos sociais mudaram, a Copersete não pode ter produtos onde está a Itambé. A Itambé, originalmente uma junção de 33 cooperativas, onde todos tinham votos, hoje só os diretores-presidentes das cooperativas podem votar. Perdeu toda a autonomia. A Itambé, de gerenciada pelas cooperativas, as gerencia ao seu interesse. As festas, os torneios leiteiros dentro das fazendas, numa atividade rural quase frequente, que reunia todo mundo, de Pirapama a Pequi, com o domínio da Itambé não existem mais. As fazendas continuam, mas os produtores tradicionais acabaram ou mudaram de atividade. 

 

Como nos explica um cooperado, entrou muito empresário grande, você não tem como concorrer. “Antigamente o cara vivia do leite, o produtor, a atividade dele era leite, os industriais estavam mexendo pra lá. Hoje um industrial compra uma fazenda até para descarregar imposto de renda, todo mundo que tem atividade lucrativa compra uma terra. Aí o sujeito pega 10 mil litros, o cara produtor mesmo tira 50, 100 litros. Aí entra aquele tirando 10 mil litros. Se ele tiver prejuízo de 1 centavo, para ele é lucro, é dinheiro que ele ia jogar pro governo mesmo, em termos. Aí a concorrência ficou muito desleal, o leite desvalorizando, como é que você vai competir com uma pessoa dessa? ” As fazendas conhecidas como as maiores produtoras é a True Type, na região de Inahúma, o Marco Antônio Araújo, na estrada de Jequitibá, num número em torno de 10 grandes produtores. 

 

Os produtores rurais, no auge de suas atividades, como foi Paulo Libório, tinham hábitos característicos, foi criador de cavalo manga larga e cavalo pampa, competiam na exposição de Sete Lagoas, com cavalos e gado de elite, estavam sempre na frente, tinham sempre gado para expor. Se Belo Horizonte tinha um conhecido, se Bom Despacho tinha, iam. A interação entre eles que se tinha antigamente. De Paulo e familiares vêm as cavalgadas mais antigas da região.

 

Paulo vendeu a Guará e tomou um prejuízo gigante com o então prefeito da cidade, nos meados dos anos 1990, a operação desastrada operada por um seu amigo de confiança, gerente de um banco cooperativado. Consegue comprar a fazenda Moradinha, do outro lado de Inhaúma, saída para Cachoeira da Prata. Vendeu a Moradinha para concluir a obra imensa da Galeria Buritis, na beira da lagoa, com um pequeno palacete acima. Comprou e montou a sua última propriedade, uma pequena fazenda no Morro Redondo, num capricho incrível, com casa de estilo colonial com dois andares, baias, currais e casa do caseiro. Saudamos os amigos que apareceram nas entrevistas, como Márcio Nery, Raimundo Campolina e Rômulo Reis. E agradecemos a entrevista principal que se baseia o texto, com Luciano França, da Fazenda Pião, último lugar que vimos Paulo vivo.

 

Por Dalton Andrade / Historiador

 

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